Entrevista com Brenda Carranza autora do livro CATOLICISMO MIDIÁTICO

Por que decidiu escrever sobre o tema?

O texto é fruto da tese de doutorado realizada durante seis anos na UNICAMP (Universidade de Campinas). O original consta de 600 páginas. Esse texto foi uma versão revisada para editoração, com linguagem mais simples e menos fontes bibliográficas, depoimentos e notas de rodapé.

Qual é a principal ideia que o leitor terá ao acabar de ler o livro?

O catolicismo brasileiro está em plena transformação interna. Ele, como o pentecostalismo protestante, sofre as mudanças que a sociedade contemporânea, a partir dos avanços tecnológicos, sofre, especialmente, as novas gerações. O leitor perceberá a clara diferença entre fazer uso dos meios de comunicação como simples veículos e participar na cultura midiática. Ao mesmo tempo, poderá esclarecer as semelhanças e as diferenças que existem entre o catolicismo midiático e as igrejas neopentecostais.

Por que escrever um livro sobre o assunto?

Primeiramente, porque considero que é uma questão relevante observar como a cultura de consumo e a mídia afetam o cerne do que na academia se convencionou de campo religioso. Depois, porque venho trabalhando em sociologia da religião desde 1992, especificamente, pesquisando e publicando sobre a Renovação Carismática Católica – Carranza, Brenda. Renovação Carismática Católica: origens, mudanças e tendências (2ªedição), Santuário, 2000 –. Por isso, analisar o auge do uso da mídia pelo Catolicismo na década passada, abrindo passo aos padres cantores, foi praticamente um desdobramento natural. Ultimamente, nessa mesma direção, tenho concentrado meus esforços em compreender as comunidades que na Igreja católica se consagram ao serviço da evangelização na mídia, o que deu origem a um outro livro organizado por mim e mais dois outros colegas da Universidade de Juiz de Fora e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro — Novas Comunidades católicas: em busca do espaço pos-moderno. Aparecida, SP: Idéias & Letras, 2009.

Ao escrever o livro, você pensa em atingir algum público específico? Qual?

Acredito que a temática chama atenção a toda pessoa curiosa por compreender como a religião pode ser afetada pelos avanços tecnológicos. Mas, o público específico pode ser identificado em duas direções: primeiro para o mundo acadêmico da sociologia da religião e da Teologia, no Brasil e na América Latina, pois aborda as relações entre catolicismo e pentecostalismo, tema fundamental hoje. Já o segundo público-alvo são propriamente os agentes de pastoral católica e das igrejas evangélicas históricas.

A comunicação é usada há milhares de anos no catolicismo, veja POR EXEMPLO O FATO DE A bíblia ser O livro MAIS vendido NO MUNDO e os programas de rádio, quando esse era e ainda é um importante meio de comunicação, e agora HÁ a TV e OS ‘Shows missas’. Você acredita que mudou a atitude ou apenas foi uma adaptação?

Cabe primeiro um esclarecimento. O show-missa é um termo consagrado pela própria mídia brasileira, na segunda metade da década de noventa, quando da aparição do Pe. Marcelo Rossi na mídia. Quando era televisionadas as missas multitudinárias por ele organizadas, seguidas de shows para entretenimento dos fiéis, a expressão foi consagrada como forma de diferenciar eventos similares entre os pentecostais. Assim sendo, show-missa é uma expressão exterior ao catolicismo, tanto teológica como ritualmente falando.

Sem dúvida, a Igreja católica mudou sim sua compreensão sobre o papel dos meios de comunicação, oscilando da escrita à era digital. Ela passou de uma atitude de rejeição e condenação dos avanços técnicos da informação, desde os remotos tempos de Gutenberg, condenando cinema e televisão, até chegar a sua bênção com João Paulo II no ano 2000, com a inauguração do site do Vaticano.

O Pe Marcelo Rossi é citado inúmeras vezes, ele é o mais midiático da nova geração que usa a comunicação de massa?

Com o apoio incondicional da mídia comercial (vide Rede Globo) e um eco magnífico na mídia católica, padre Marcelo ajudará consolidar uma presença católica perante a sociedade brasileira. Mas esse quadro tem mudado nos últimos anos com a ascensão do Pe. Fabio de Melo que vem contando com o mesmo apoio e investimento estratégico mercadológico. Entretanto, tudo indica que mais que concorrentes comerciais eles têm complementado um nicho de mercado em formação, que é a mídia religiosa católica. O meu livro aborda essa interação e assinala como esse mercado é reforçado quando muitos padres, leigos, diáconos, jovens, bandas e religiosos/as acompanham essa ascensão midiática, embora não tenham o mesmo potencial comercial.

Isso é positivo ou negativo?

O cientista social não se compromete com juízos de valor, nem se pergunta se é bom ou ruim, pois não cabe a ele julgar. A minha tarefa no livro é indicar as conexões que o fenômeno midiático tem com a sociedade, o mundo, a tecnologia, a Igreja, o pentecostalismo etc. O leitor defronta-se com um texto que lhe indica “mapas de compreensão do fenômeno”. É o leitor que toma uma postura, se é que é esse o objetivo da sua leitura.

Na página 142, você escreve esse trecho: … “Mas a Mídia logo daria clara mostra que não é um puro ‘instrumento neutro’ a serviço de quaisquer interesses, ela é, sim, uma instituição produtora de sentidos, com uma lógica própria de interpretação e construção da realidade, a partir de uma visão de mundo, a capitalista; portanto, apropriar-se dela como meio evangelizador não isenta a igreja desta lógica”, você poderia comentar e discorrer sobre esse assunto?

Ao falarmos de cultura midiática estamos nos referindo a um processo social mais complexo que acontece entre meio de comunicação social, a própria produção de conteúdos, símbolos, mensagens, interpretações, e a recepção da produção da mídia. Assim, para ter uma eficácia no uso da mídia é necessário entrar na lógica midiática, que se assenta, por exemplo, em mensagens rápidas, curtas, mais reativas do que reflexivas. De tal modo que pautar a mensagem religiosa nessa lógica significa abrir mão de outras propostas éticas que as instituições religiosas possam almejar, tais como uma visão crítica da sociedade e das relações sociais…

A construção midiática, como por exemplo a papal, tem sito útil À igreja ou banaliza o verdadeiro processo do contato da igreja para se aproximar de Deus?

Acompanhando o raciocínio da resposta anterior, acho que a pergunta pode ser mais fértil se formulada em outros termos: Quais as consequências que o investimento na mídia, como meio de evangelização, traz para a Igreja? A partir daí, cabe a cada geração eclesiástica questionar-se qual a mensagem religiosa pertinente para os novos tempos. Isso denomina-se teologicamente “sinais dos tempos”.

A mídia como um todo tem diminuído o tempo em que as pessoas freqUentam espaços públicos. Isso tem acontecido com as reuniões em missa? As pessoas preferem assistir À missa no conforto do seu lar?

Parece-se-me que o que está mudando é mais profundo que uma prática relgiosa. Assim, qual é a compreensão do real significado das relações face a face no mundo moderno, ou seja em todas as dimensões sociais, não só na Igreja católica? Pais e professores queixam-se que não “se encontram mais” com os jovens, pois eles estão sempre “on-line” e preferem encontros virtuais a presenciais. Talvez, a prática religiosa das novas gerações esteja sofrendo uma transformação, isso inclui os ritos religiosos, como eucaristias (missas) e cultos, mas não acredito que a única causa seja a mídia. Penso que existem outros fatores como: a multiplicação de inúmeras ofertas que preenchem de sentido a vida do homem e mulher urbanos. A urbe se converte num imenso potencial de entretenimento e de socialização.

Para você a cdriação de celebridades critãs é um meio benéfico à Igreja?

A celebridade, parece-me, é produto da cultura de massa, pivô dos estudos sobre a indústria cultural. Nessa direção, a construção midiática da fama, com sua ascensão e queda, responde a um circuito que a própria mídia cria, seguindo a seguinte premissa: aparece na mídia, portanto, é importante; é importante porque está na mídia. No momento em que a pessoa/fato/acontecimento/fenômeno sai da mídia cai na desgraça, na morte social. Além disso, a celebridade está sujeita aos imperativos da fama, com as devidas consequências de ser pessoa pública sem vida privada, sem direito a errar, sem tempo e espaços pessoais. Se isso é um fardo para qualquer pessoa/artista/homem-mulher público, para um representante religioso, sem dúvida, o será mais. Com isso, uma celebridade religosa, inclusive cristã, será portador de um nome, de uma representação institucional. Tudo o que faça e diga será referido à instituição a qual faz parte, portanto, querendo ou não o cuidado da “fama” deverá ser redobrado. Evidentemente que, toda fama/celebridade tem seu preço, cabe as instituições avaliar os prós e contras.

Qual é o maior ícone deste exemplo no Brasil e no Mundo?

Parece-me que, mais que para pessoas/celebridades/ícones do momento, devemos nos atentar para o fato que a própria sociedade no seu atual estágio de cultura de consumo se move na dinâmica de criação de celebridades para pautar comportamentos sociais. Essas celebridades tornam-se ícones na medida em que trazem embutida uma liderança. Seja qual for o campo, ora cultural, político, ora religioso, não deixam de ser celebridades sujeitas à intempestividade das ondas de consumo. Mais ainda, a mídia turbina essa tempestade a partir da efemeridade e da novidade que, como princípio gerador, dita quem é o ícone nacional e mundial “conveniente”. Daí que, ícones mundiais estão sempre fadados a desaparecer no momento em que aparece um outro que os desplaza, sendo da própria natureza a sucessão de celebridades, não importando quem esteja no palco, o importante é que alguém esteja para manter aquecido o mercado.

No processo midiático, no processo de avalanches de novas mídias vividas nos últimos anos, NASCE uma nova forma da igreja se comunicar e UMA nova forma de ‘ser católico’?

Se compreendemos que a identidade é uma matriz flexível que busca estratégias para sobreviver às mudanças, evidentemente, que o “ser católico” se refaz a cada época, mudando segundo os tempos. Isto é, a realidade histórica não deixa ilesos os processos institucionais e a maneira como as igrejas dialogam com a sociedade. Por isso, o uso da mídia não só modifica determinados setores da Igreja, mas muda as próprias concepções que o cristianismo tem de si mesmo, portanto, as novas formas de comunicação afetam o campo religioso como um todo.

Sobre a autora:

Brenda Carranza

Originária da Guatemala, residente no Brasil desde 1990.

Formada Teologia/PUC-Campinas e em Ciências Sociais/ UNICAMP; Mestre em sociologia e doutora Ciências Sociais/UNICAMP

Atuação profissional:

Professora da  Pontifícia Universidade Católica de Campinas; Área de concentração Antropologia Teológica.

Últimas publicações: Novas Comunidades Católicas. Editora Idéias & Letras, 2009; Catolicismo midiático, Editora Idéias & Letras, 2011.

Coordenação editorial: Coleção: Sujeitos & Sociedades, Editora Idéias & Letras

Assessoria permanente e esporádica: Instituto Nacional de Pastoral INP/CNBB; Conferência Nacional dos Religiosos do Brasil (CRB); Consejo Episcopal Latinoamericano (CELAM)

Linhas de pesquisa:

Catolicismo, pentecostalismo, fundamentalismo, cultura midiática, cultura urbana, juventude, subjetividades, novas gerações.

Grupos e Projetos de pesquisa em andamento:

  • Projecto de investigación: Catolicismo popular e religiões afrocubanas. Profª. Brenda Carranza (responsável). Financiado por la Arquidiocese de Santiago de Cuba;
  • Projeto internacional Center for the Study of Latin American Pentecostalism. Prof. Paul Freston (responsável). Financiado pela Pentecostal and Charismatic Research Initiative (PCRI) da University of Southern California (directed by Prof. Donald);
  • Projecto de Investigación internacional e Interdisciplinar de Pastoral Urbana en América Latina. Profª. Margit Eckholt (diretora do proyecto), locado na Universität Osnabrück/Alemania.

CONTATOS COM A AUTORA:

Autora: Brenda Carranza

Email: brenda_poveda@terra.com.br

Nicolau Kietzmann Goldemberg

DGNK Assessoria de Imprensa

11- 3070-3336

11 – 8273-6669

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Uma resposta para Entrevista com Brenda Carranza autora do livro CATOLICISMO MIDIÁTICO

  1. ricardo peixoto disse:

    a igreja católica desde os primórdios sempre soube elaborar muito bem o hibridismo multicultural, haja visto a propria sobrevivencia da cultura ocidental preservada , transcrita e guardada como um tesouro cultural pela igreja católica, por isso mais do que humana ela é divina.

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